"O anarquismo defende a possibilidade de organização sem disciplina, temor ou punição, e sem a pressão da riqueza."

emma goldman

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2010/03/03

por e-mail__14

[Reino Unido] Colin Ward:

"Como construir a anarquia hoje"

Colin Ward, o grande anarquista, acadêmico e jornalista britânico, morreu em 11 de fevereiro, aos 86 anos.

Ward foi sempre atento as formas de como a sociedade já funcionava cooperativamente, e nos incentivou a entender tais impulsos e experimentos como um potencial latente para o anarquismo.

Algumas das coisas que geralmente passa como abordagens do senso comum para a educação, arquitetura ou organização social são temas que Ward tocou em seu trabalho e desde então está em nossa consciência popular.

Muitos de nós temos sido tocados pela obra de Ward, às vezes sem sequer darmos conta.

Ward certamente acreditava que existem tempos e lugares onde se deve enfrentar ao Estado, mas seu anarquismo era ao mesmo tempo construtivo, criativo e imensamente prático. Conseguiu chamar a atenção de muita gente de fora do movimento anarquista.

Depois da II Guerra Mundial, Colin se aproximou do lendário semanário Freedon (criado por Kropotkin em fins do século XIX e que até hoje perdura: www.freedonpress.org.uk), onde contribuiu periodicamente.

Seus primeiros artigos jornalísticos se referiam ao movimento okupa britânico dos anos 40, que para desespero do governo trabalhista, milhares de trabalhadores responderam a escassez de moradia, tomando e adaptando as bases militares em desuso.

Ward os via como um exemplo do que posteriormente chamaria "anarquia em ação": autogestão direta e cooperativa.

Entre 1961-70, Colin Ward editou Anarchy, certamente a mais interessante revista teórica anarquista publicada no Reino Unido. Através da revista Colin amadureceu as idéias que culminariam em seu livro "Anarchy in action" (Anarquia em ação 1973), um dos fundamentais de sua obra.

Todas as sociedades, afirmava Colin Ward, são plurais, elas resolvem problemas e satisfazem necessidades, utilizando uma variedade de mecanismos. Usam técnicas comerciais e de mercados; usam a autoridade e técnicas burocráticas e gerenciais, e também técnicas mutualistas, de ajuda mútua e de cooperação autogestionaria.

"Anarquia" para Colin é simplesmente qualquer espaço social onde as técnicas de mutualidade predominam; um espaço social onde as pessoas entram (e saem) livremente; se relacionam como iguais; e fazem algo criativo para resolver um problema, satisfazer uma necessidade ou somente desfrutar da criatividade nela mesma.

E o objeto do anarquismo é tentar empurrar e impulsionar a sociedade na direção de maior anarquia neste sentido.

Assim, Colin salientou que a anarquia de fato já está em grande parte do nosso mundo social, incluindo as diversas formas associativas, mutualistas, igualitárias e de espaços sociais cooperativos.

Sua propaganda freqüêntemente estava orientada a mostrar como alguns problemas sociais relevantes poderiam ser melhor enfrentados com técnicas de apoio mútuo livre e cooperativa.

Sobre a questão de moradia, Ward foi crítico dos esforços estatais britânicos, liderados por especialistas em habitação provenientes da classe média, para prover moradia às classes trabalhadoras.

Neste contexto, apoiava as experiências da esquerda alternativa de cooperativas autogestionárias, como as cooperativas de inquilinos, assim como os projetos autoconstruídos e a "okupação".

Assinalou repetidamente a lógica dos governos locais, muitas vezes controlado pelo governo trabalhista, que preferiam destruir moradias sociais não utilizadas que permitir que fossem ocupadas pelos "okupas".

Por outro lado, Colin Ward se opunha fortemente ao perfeccionismo anarquista, a visão de que a anarquia deveria ser para “todos ou para ninguém”. Sua concepção de anarquia e do anarquismo lhe permitia apresentar a anarquia não como ”tudo ou nada”, senão em termos de "mais ou menos”.

Assim mesmo, esteve profundamente interessado na ciência social empírica. A possibilidade de técnicas anarquistas para atacar os problemas sociais, era para Ward, uma hipótese de trabalho, que devia ser validada pela investigação.

Sua própria pesquisa gradualmente tomou um caráter histórico, buscando documentar e explorar como as pessoas realizaram o uso "não oficial" de seu meio ambiente. Ward dava ênfase especial na criatividade das pessoas comuns e das formas em como usamos a energia criativa para transformar nossos ambientes.

Não tinha problemas em imaginar uma sociedade imersa na liberdade e na ordem espontânea, porque sabia que a liberdade e a ordem espontânea era o que sustentava a sociedade em primeiro lugar, mesmo que às vezes tomasse uma forma atrofiada.

Um dos seus livros mais influentes e lidos é "The child in the city" (O menino na cidade - 1978), onde expressa amorosamente a forma de como as crianças realizam seus próprios usos criativos dos ambientes urbanos com que são deparados.

Colin realmente apoiou a confluência de duas tradições; por um lado, ele foi formado por uma tradição teórica do anarquismo, conhecia os clássicos, especialmente o texto de P. Kropotkin "Campos, Fábricas e Oficinas".

Por outro, Ward estava também animado pelas difusas tradições das classes trabalhadoras e tradições autogestionárias para fazer com que as coisas funcionem, para fazer o mundo melhor de uma forma simples, mas realizável. Buscou levar estas tradições ao diálogo, para seu mútuo benefício.

Os temas sobre o qual Ward escrevia - "anarquismo, moradia, ambiente, transporte, arquitetura, uso não oficial do espaço, a educação das crianças" -, estavam sempre cheio de exemplos positivos atuais e a maneira de como podemos viver no futuro.

Muitos viam nele a evidência de que havia mais vida que o protesto permanente; como Gustave Landauer, Colin considerava que o estado é uma relação e que temos que tratar de construir outro tipo de relações sociais, e com Paul Goodman estava de acordo quando este observava que "uma sociedade livre não pode estar substituindo uma 'nova ordem' da velha ordem; ela deve ser a extensão da esfera do livre atuar, até que haja mudado a maior parte da vida social".

[Colin Ward, 14 de agosto de 1924 - 11 de fevereiro de 2010]

por Sociedade de amigos contra o Estado


Elaborado com base nos seguintes textos de homenagem:

NN (2010) Colin Ward: pioneer of mutualism: http://www.nextleft.org/2010/02/colin-ward-pioneer-of-mutualism.html

Walke, Jesser (2010) Colin Ward, RIP: http://reason.com/blog/2010/02/17/colin-ward-rip

Tonkin, Boyd (2010): The good life of a gentle anarchist: http://www.independent.co.uk/arts-entertainment/books/features/boyd-tonkin-the-good-life-of-a-gentle-anarchist-1903818.html

agência de notícias anarquistas-ana

a lua deita seus
raios sobre a rosa caída.
beleza morta.

Rosa Clement

Um comentário:

Anônimo disse...

Maravilha o pensamento de Colin Ward. Anarquia é aqui e agora, o mais rápido possível, da melhor maeira possível. O que precisa é ampliar a anarquia que já existe, agir, interferir na vida social