o extermínio dos inclassificáveis
- autos de resistência à sociedade de controle -
Vera Malaguti Batista
O subtítulo deste livro – “uma vontade de sujeição” – denuncia a adesão subjetiva de parte da sociedade à barbárie, com a crescente demanda coletiva por castigo e punição. A cultura punitiva tem na figura da vítima o seu principal dispositivo e no medo a sua mais potente metodologia.
Cada indivíduo se transforma em uma vítima em potencial, cercada por fatores de risco e fatores de proteção. Desenvolve-se o mercado da segurança, e a expansão do poder punitivo, em todas as direções, captura a Academia, a sociedade civil e movimentos da cidadania. Atrás do discurso politicamente correto do bom-mocismo acadêmico, o que se vê é a legitimação do aumento exponencial dos autos de resistência, que só no Rio de Janeiro chegam a 1.300 por ano.
Nas classificações, estatísticas e georreferenciamentos sempre há espaço para o extermínio dos inclassificáveis. O Estado agencia o extermínio, e a intelligentsia trata de mascará-lo atrás das boas intenções, as políticas de segurança pública com selo dos direitos humanos. As operações letais de alta intensidade não precisam mais ter sentido técnico, de resultados: o sucesso é o enfrentamento em si. Enquanto se dá o extermínio em níveis ascendentes, a sociologia faz a sua parte, calculando o custo dos presos, mapeando as criminalidades, organizando as vítimas, treinando os policiais.
Edson Lopes aponta as semelhanças entre a tautologia positivista e a sociologia funcionalista de hoje. Nos geoprocessamentos das vulnerabilidades juvenis, a descrição em si da pobreza (desestruturações econômicas e familiares, humanos sempre “em falta”) é que vai ser associada ao crime e à periculosidade a serem administrados pelo controle territorial: com prevenção e repressão. Precisamos produzir um mapa que demonstre a coincidência territorial entre essa sociologia funcionalista e o aumento do extermínio. São essas pesquisas tautológicas que fornecerão a comprovação científica da relação entre a pobreza e a criminalidade: vão produzir argumentos para a expansão do poder punitivo em todas as direções.
Ao demonstrar essa vontade de sujeição e ao desmascarar os discursos que lhe dão suporte, Edson Lopes nos ajuda a interpretar melhor a nossa torturante contemporaneidade. Os efeitos estão aí: principalmente a fascistização das relações sociais e a inculcação subjetiva do desejo de punir.
Indicamos para leitura:
POLÍTICA E SEGURANÇA PÚBLICA: UMA VONTADE DE SUJEIÇAO, de Edson Lopes.
Editora: Contraponto
Nenhum comentário:
Postar um comentário