"O anarquismo defende a possibilidade de organização sem disciplina, temor ou punição, e sem a pressão da riqueza."

emma goldman

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2010/09/21

extraindo conceitos

As eleições e a mistificação do Estado

As eleições, ainda que sejam apresentadas como o ápice, e muito comumente como a única forma de participação política nas sociedades de capitalismo democrático, são na verdade uma mistificação conservadora e uma forma de alienação política, visto que tratam sempre de uma transferência de poder para outros e do abandono da luta direta contra o capital em nome de medidas reformistas e democratizadoras, hoje cada vez mais difíceis de serem realizadas.

Durante mais de um século, as esquerdas, tanto quanto a direita, prestaram ao capital o precioso serviço de mistificar o papel do Estado e ajudaram a disciplinar e circunscrever as lutas no interior da sociedade capitalista aos limites da institucionalidade burguesa.

A direita cretina sempre mistificou o papel do Estado, porque afinal de contas ela é naturalmente uma defensora ardorosa da barbárie capitalista, e por isso, sempre se serviu do Estado para defender a ordem e os interesses da classe dominante.

Já a esquerda reformista (e também a bolchevique!), também mistifica o Estado na medida em que o considera como um instrumento, que tanto pode ser colocado a serviço da burguesia como da classe trabalhadora, dependendo de quem o controla. É nessa visão instrumental que ela vai buscar justificativa e legitimidade para seu projeto político de controle do aparelho estatal.

A mistificação, neste caso, consiste em abstrair o Estado da rede de relações sociais capitalistas da qual é parte e apresentá-lo como um ente autônomo em relação ao capital. Dessa forma, o Estado é apresentado de forma invertida:

de agente ativo do processo de dominação capitalista e defensor dos interesses da classe dominante, ele aparece como principal agente de mudança e defensor dos interesses da classe trabalhadora.

A própria realidade da economia capitalista atual se encarrega de desmentir essa mistificação, visto que hoje ela possui uma capacidade inigualável de se impor aos Estados nacionais, reduzindo cada vez mais suas margens de autonomia para definir até mesmo suas prioridades de investimento.

Estes se direcionam cada vez mais para atender o setor privado, ao passo que diminuem no setor público, degradando cada vez mais os serviços públicos fundamentais como saneamento, saúde, educação, previdência, etc.

Mesmo os Estados mais poderosos tiveram que adaptar-se aos imperativos do capital mundializado, de forma a muni-lo de condições favoráveis de lucratividade, encarregando-se de providenciar-lhe recursos e meios institucionais que lhe garantam apropriar-se destrutivamente dos recursos naturais e arrancar sem dó o couro de uma força-de-trabalho cada vez mais fragilizada e em condições de super-exploração.

Por outro lado, é exatamente porque o capitalismo provoca um aumento da exploração e das desigualdades, que ele também provoca incessantemente a necessidade de conflitos sociais. Como não pode fazer um uso generalizado da violência, e ao mesmo tempo precisa resguardar o domínio do capital e da classe dominante contra ataques ameaçadores, o Estado é obrigado a recorrer constantemente a mecanismos institucionais de arregimentação e disciplinamento das lutas.

Trata-se sempre de tentar circunscrever as lutas aos limites da institucionalidade e as disputas políticas internas ao sistema representativo burguês (eleições, disputas entre esquerda e direita, etc.) como forma de desviá-las do combate direto contra os poderes econômicos e estatais.

Não foi por outro motivo que a sociedade de mercado convenceu-se já faz tempo que pode conviver tranquilamente com a democracia representativa, com eleições livres e com governos de esquerda, fazendo disso poderosos elementos de pacificação social.

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