"O anarquismo defende a possibilidade de organização sem disciplina, temor ou punição, e sem a pressão da riqueza."

emma goldman

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2010/10/21

extraindo conceitos


Nessa direção, a presente resenha do livro de Rocker tem o objetivo de, por um lado, refletir sobre a origem teórica dos conselhos, demonstrando a sua estreita proximidade com a tendência anarquista que se desenvolve no seio da Primeira Internacional e, por outro, analisar o desenvolvimento prático dos conselhos durante a Revolução Russa de 1917, sublinhando a sua eventual incompatibilidade com ditadura do proletariado implantada pelo partido bolchevique após a tomada do poder por Lênin e seus seguidores.

Ao traçar a genealogia da idéia de conselhos, Rocker remonta até a longínqua década de 60 do século XIX, período onde aparece, como já sabemos, a Associação Internacional dos Trabalhadores.

Para o nosso autor, foi com o surgimento e transformação da Internacional que o movimento operário europeu começou a se preparar para “despojar os últimos restos do radicalismo burguês e voar com as suas próprias asas” (p.78).

Portanto, na medida em que a Internacional tomava consciência de si mesma, a idéia dos conselhos operários ia ganhando contornos cada vez mais nítidos entre seus aderentes. De congresso em congresso, essa idéia aparecia aqui e acolá.

Mas, sem sombra de dúvidas, ela só foi precisada e desenvolvida com a clareza que lhe era necessária no Congresso da Basiléia, no ano de 1869.

De acordo com Rocker, foi no congresso em questão que o anarquista belga Eugins Hins teria discutido pela primeira vez as tarefas presentes e futuras das organizações sindicais no que concerne a realização do socialismo.

Em sua moção, Hins sustentava que da organização surgida para a defesa do trabalho contra o capital, nascerá “a administração política das comunas”, onde “os conselhos das organizações de ofícios e indústrias substituirão o governo atual e a representação do trabalho substituirá de uma vez por todas os velhos sistemas políticos do passado”. (p.80)

Segundo Rocker, tal premissa teria surgido da compreensão de que existe uma íntima relação entre os fatores econômicos e políticos que compõem a vida social.

Como acreditava que, com a vinda do socialismo, a era da exploração do homem pelo homem teria findado, a dominação do homem pelo homem também deveria sê-lo.

Logo, a materialização da sociedade socialista demandaria não apenas de uma nova forma de expressão econômica, mas, também e, sobretudo, de uma nova forma de expressão política, pois, ela só seria realizável no âmbito desta última.

“Essa nova forma”, pensava ele, “poderia ser encontrada no sistema de conselhos”(p.80).

Como estavam cônscios de que a sua tarefa era se apoderar dos meios de produção econômica, acreditavam não ter necessidade de organizar um partido político e tomar o poder do Estado, mesmo que este último tivesse o nome de proletário.

Para Rocker, o adágio sainti-simoniano de que o governo dos homens deveria dar lugar à administração das coisas era a pedra de toque identitária da filosofia dos internacionalistas.

Todavia, apenas as seções espanhola, italiana e francesa, que se encontravam sob a influência das idéias de Bakunin é que aderiram e, portanto, defenderam a proposta conselhista.

Em virtude disso, tiveram, irrevogavelmente, de se bater contra Marx, Engels e os demais representantes do Conselho Geral, que ficava situado em Londres.

Ao contrário dos anarquistas, os marxistas acreditavam que era a ditadura do proletariado, sob a direção do partido de vanguarda, a quem caberia a incumbência de reconstituir a sociedade num sentido socialista.

Segundo o anarquista alemão, Marx teria herdado essa teoria dos jacobinos e outros intelectuais vinculados à burguesia radical.

A título de exemplo, Rocker cita o livro “O Manifesto Comunista” escrito por Marx, em pareceria com Engels, onde a idéia de ditadura do proletariado parece como sinônimo da tomada do poder do Estado por um partido político, que existiria até que os conflitos entre as classes desaparecessem completamente.

Como o despotismo do método corresponde ao despotismo da ação, não demorou muito para Marx conseguisse expulsar os anarquistas da Internacional.

Foi justamente o que aconteceu no Congresso de Haia em 1872, onde o Marx conseguiu, através da manipulação dos votos, obter a maioria necessária para expulsar Bakunin, Guilhaume e outros anarquistas, neutralizando desse modo a influência dos mesmos sobre o movimento operário europeu.

Após o fim da Internacional, que depois de transferida para Nova York perdeu qualquer relevância política, e a destruição da Comuna de Paris, fatos ocorridos no mesmo ano, o conselhismo foi completamente olvidado.

segue...


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fonte:

São Paulo: Hedra, 2007

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