"O anarquismo defende a possibilidade de organização sem disciplina, temor ou punição, e sem a pressão da riqueza."

emma goldman

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2011/01/23

extraindo conceitos

Como os animais fazem negócios (4)


Humanos e outros animais compartilham uma herança de tendências econômicas, incluindo cooperação, retribuição de favores e ressentimento com comportamentos desonestos.

por Frans B. M. de Waal


Mercados Biológicos

Visto que a reciprocidade requer parceiros, a escolha deles é fundamental na economia comportamental.

As transações imobiliárias que ocorrem entre os caranguejos eremitas são excessivamente simples comparadas com as interações entre primatas, que envolvem muitos parceiros trocando múltiplas moedas, como catação, sexo, apoio em lutas, alimentação, serviço de pajem e assim por diante.

Esse "mercado de serviços", como apelidei no livro Chimpanzee Politics [“A Política dos Chimpanzés”], significa que cada indivíduo precisa ter boas relações com os indivíduos mais destacados, para estimular parcerias de catação e - se forem ambiciosos - fazer acordos com outros do mesmo nível.

Os machos formam coalizões para desafiar o soberano reinante. Após a subversão, o novo soberano precisa manter seus ajudantes satisfeitos:

um macho alfa que tenta monopolizar os privilégios do poder, tal como o acesso às fêmeas, tem pouca chance de manter sua posição por muito tempo.

E os chimpanzés agem assim sem nunca terem lido Maquiavel.

Com cada indivíduo negociando com os melhores parceiros e vendendo seus próprios serviços, a estrutura para reciprocidade se torna de oferta e procura, precisamente o que Ronald Noë e Peter Hammerstein, então do Instituto Max Planck de Fisiologia Comportamental, tinham em mente com a teoria do mercado biológico, que se aplica sempre que é possível escolher com quem negociar.

Essa teoria postula que o valor das mercadorias varia com a disponibilidade. Os estudos a seguir aprimoram esse ponto.

Como todas as fêmeas de primatas, as dos babuínos são irresistivelmente ligadas aos filhotes - não apenas aos seus, mas também aos de outras fêmeas. Elas emitem grunhidos amigáveis e tentam tocá-los.

As mães, entretanto, relutam em deixar qualquer um segurar seus recém-nascidos. Para se aproximarem, as fêmeas interessadas limpam a mãe enquanto espreitam os bebês. Após uma sessão relaxante de catação, a mãe pode ceder ao desejo das outras fêmeas de olharem de perto.

Essas, portanto, "pagam" para passar um tempo com o recém-nascido. A teoria de mercado prediz que o valor dos bebês deveria subir se há poucos nas redondezas.

Num estudo com babuínos da África do Sul, Louise Barrett, da Universidade de Liverpool, e Peter Henzi, da Universidade de Lancashire Central, ambas na Inglaterra, descobriram que as mães com poucos filhotes cobram mais caro (um período maior de catação) do que as mães com muitos filhotes.

Situação parecida ocorre com os peixes limpadores da espécie Labroides dimidiatus, que se alimentam de parasitas dos peixes maiores. Cada limpador tem sua "estação de limpeza" num recife de coral para onde a clientela se dirige a fim de que ele faça seu trabalho.

O limpador mordisca o parasita e o retira do corpo do cliente, das nadadeiras e mesmo do interior da boca. Algumas vezes, o limpador fica tão ocupado que os demais peixes têm de esperar em fila.

Os clientes aparecem em duas variedades:

residentes e visitantes.

Os primeiros pertencem a espécies com pequenos territórios; eles não têm escolha senão ir até o seu limpador local. Os visitantes, por outro lado, ou controlam um território grande ou viajam bastante, o que significa que podem escolher entre várias estações de limpeza.

Querem esperar pouco e que o serviço seja de qualidade e sem fraudes. Isso ocorre quando um limpador mordisca o corpo do cliente alimentando-se do muco saudável do seu corpo, o que espanta os clientes.

Pesquisas feitas por Redouan Bshary, do Max Planck, consistem principalmente em observações nos recifes de coral, mas também incluem experimentos em laboratório. Seus artigos parecem um manual de bons negócios. O visitante tende mais a mudar de estação de limpeza se o limpador o ignora por muito tempo ou o engana.

Os limpadores parecem saber disso e tratam os visitantes melhor do que os residentes. Se um visitante e um residente chegam ao mesmo tempo, o limpador quase sempre dá preferência ao visitante. Como os residentes não têm para onde ir, ficam esperando sua vez.

Os únicos que os limpadores nunca trapaceiam são os predadores, que têm uma contra-estratégia radical:

engolir o limpador.

Com os predadores, os limpadores adotam sabiamente, nas palavras de Bshary, uma "estratégia cooperativa incondicional".

A teoria do mercado biológico oferece uma solução elegante para o problema dos "penetras", que ocupa os biólogos há muito tempo, pelo fato de os sistemas de reciprocidade serem vulneráveis àqueles que tomam, e não aos que dão.

Os teóricos assumem que os ofensores devem ser punidos, embora isso ainda tenha de ser demonstrado entre os animais. Em vez disso, é possível lidar com os trapaceiros de maneira mais simples.

Se existe escolha dos parceiros, os animais podem simplesmente abandonar as relações insatisfatórias e substituí-las por aquelas que oferecem mais benefícios. Os mecanismos de mercado são suficientes para colocar de lado os aproveitadores.

Mesmo em nossa sociedade, não confiamos naqueles que querem receber mais do que dar.

segue...


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